Pra Me Enlouquecer É Mais Caro

República Anárquico-frevocrática fundada em 2002 por Rainha do Maracatu Roubada de Ouro, Senhor do teu Anel e Catirina Sem Mateus. Atualmente é administrada pela Mulherzinha 3.4 e a Rainha do Maracatu Roubada de Ouro. Afinal de contas, nunca perdemos a nossa majestade

quinta-feira, outubro 29, 2009

Gente do Rio - e de Recife, "com orgulho e com saudade"

"Menina, pára de emagrecer. A bunda já está desaparecendo". É com esta frase que sou recebida diariamente na copa do trabalho. Com seu uniforme bem passado, ela me cumprimenta efusivamente, enquanto tomo o primeiro dos pelo menos 10 copos de água previstos na minha dieta diária, que já me fez abandonar 12 incomodáveis kg.

Moradora do Rio, a moça de 56 anos é pernambucana, assim mesmo se define. Melhor dizendo: é de Olinda. Sabe como são olindeses, fazem questão de distinguir entre os que moram antes e depois da Ilha do Maruim.

Ela viveu na terra natal só até os 9 anos. Sua família tinha o mesmo objetivo dos milhares de nós que saíram de casa rumo ao Sudeste. Na década de 60, pai, mãe e cinco filhos deixaram Olinda para desembarcar no barro vermelho de Brasília. "Meu pai contava que construiu uns quatro prédio lá", recorda. De lá, atraída por uma irmã da mãe que já morava no Rio de Janeiro, a família deixou a capital recém-inaugurada rumo à antiga capital da República. Assim chegaram na Cidade Maravilhosa.

Do Rio de Janeiro, não gosta. "Tenho medo de sair na rua", diz ao comentar sobre a violência. De Olinda, só tem boas e vagas lembranças. Guarda o que sua mãe contava em casa. Ouviu falar do carnaval - "dizem que é tudo pela rua, livre. Uma festa bonita"; da culinária, não esquece o cuscuz com leite de coco, nem a pamonha - "era o nosso café da manhã. Só de lembrar da água na boca".

Conterrânea, como a chamo, desde os 9 anos nunca voltou para Olinda. Não sabe descrever ruas e as ladeiras, cantarolar os acordes do frevo, nem se recorda do nome do bairro em que mora. Já tentei : Bairro Novo, Amparo, Bonsucesso. Nada.

Aqui (no RJ), casou, formou família. Seus filhos nunca foram a Pernambuco, apesar de parte da família ainda morar em Olinda.


Certo dia, com muita ressaca, entrei na copa para pegar uma dose extra de água. Sentei no banquinho improvisado e, sem muita pretensão, comecei a falar de Pernambuco. Tirei da memória a presença/ocupação holandesa e daí, desatei a contar histórias da primeira capitania hereditária que deu lucro, de como o Bairro do Recife se formou, da primeira ponte da cidade inaugurada com um "boi voador"; de como "fundamos" (os pernambucanos judeus) New York; de como fizemos nascer o Oceano Atlântico (união entre os rios Beberibe e Capibaribe, para os estrangeiros leitores); que temos o melhor carnaval do mundo; a maior fábrica de garrafas pet das Américas; a maior Avenida em linha reta do Hemisfério (Avenida Norte).....

Ah, que painho e mainha sempre ensinam para não sair dizendo para todo mundo que é pernambuco, não. "É, minha filha, é para não humilhar as pessoas", justificam.

Com olhos bem abertos, ela ouviu atenta ao relato desconexo de fábulas e hipérboles típicas de pernambucanos e de fatos históricos que vinham na minha memória.

Depois de uns bons minutos de saudosismo, voltei para o trabalho. Com sede de Pernambuco, de contar e saber mais sobre a nossa história. De espalhar ao mundo os versos de Antonio Maria: "Sou de Recife com orgulho e com saudades. Sou de Recife com voltade de voltar....."

Ela me pára a canção que embalava na mente e, em voz baixa e devargazinho, me diz : "Obrigada, conterrânea (assim também ela me chama). Acho que tenho que voltar em Pernambuco e levar meus filhos".

Volta, conterrânea, volta.

PS - Chego na terrinha no final de novembro. A partir de hoje começo a contar os dias. Me deu uma saudade danada.

PS2 - Até próxima semana, Rainha do Maracatu está de "férias" do blog, do mundo e de Recife. Vamos ver como nos "arrumamos" por aqui.