Eu ainda odeio a Barbie....
Primeiras decepções de infância : o mundo tal qual é
Aos seis anos de idade, tive duas decepções. Vamos começar pela primeira delas: descobrir que Papai Noel não existia. Foi assim; de forma seca e direta. Na noite de Natal recebemos os presentes diretamente das mãos de nossos responsáveis. Éramos quatro crianças frustradas entre cinco e sete anos (eu, meu irmão e um casal de primos) em meio a uma sala que ostentava uma tímida árvore de Natal e uma ceia conforme requer a ocasião.
Tal qual não foi nossa decepção ao ver, descendo as escadas de nossa residência à beira da Praça da República, em Belém, nossas mães carregando pacotes. O que deveria ser aquilo? Presentes? Que bom! Adoramos presentes, mas onde está Papai Noel? Puxa, da primeira vez em que tivemos permissão para ficarmos acordados até tarde (e criança adora insistir em ficar acordada até mais tarde para receber em mãos o tão sonhado presente de Papai Noel!) e descobrir, assim, que Papai Noel não existia!
Não que não esperássemos um presente, mas a minha imagem de Papai Noel estava necessariamente mais ligada a um conceito etéreo de alguém que avaliaria o meu desempenho disciplinar ao longo do ano e, após tal julgamento, definiria se eu havia sido uma menina boa o suficiente que merecesse uma recompensa. Era mais um conceito idílico e pueril em torno de uma figura mística, quase como um Deus onipresente que seria abalizado a me julgar (e não é essa a imagem de Divindade que trazemos dentro de nós? Algo superior e intocável capaz de nos compreender e julgar nossas falhas e desenganos?).
Pois foi assim. Papai Noel (e minha primeira imagem de Divindade, ou ao menos, seu primeiro Porta-estandarte), não existia. Deixaria de existir para todo o sempre dentro de mim, que mais tarde descobriria que se tratava nada mais do que uma estratégia de marketing bem sucedida. Tristes esses dias de globalização e supremacia americana em benefício do consumismo; esse mal que aflige a população mundial desde a instalação definitiva do capitalismo tardio...
Minha segunda decepção foi quase tão grave quanto a primeira: como estávamos em duas meninas (eu e minha prima), ganhamos o mesmo presente: cada uma recebeu uma Barbie em Roupa de Gala. O ano era 1982 e a boneca, sucesso absoluto há pelo menos 20 anos no exterior, era artigo recém-lançado no Brasil, coisa fina, desse tipo de presente que a gente leva à escola e as amiguinhas dizem “Noooooooossa, mas você ganhou uma Barbie?!?!?!?!”
Eu odeio a Barbie (nada contra a empresa que a produz, entendam-me, por favor!) Mas esse conceito estúpido e slogan machista imputado à eterna diva das bonecas “Tudo o que você quer ser”, não me convencia nem quando eu media 1m de altura! Eu não gostava de bonecas! Eu queria jogos interativos, um estojo de pintar, um livro do Sítio do Pica-pau Amarelo, qualquer coisa...mas uma boneca? Em roupa de gala?
Crescidinha que já estou, explico: Eu nunca quis ser a Barbie. A Barbie, nada mais seria do que a representante das loiras altas, de longas pernas, esguias e com seios que apontam para o firmamento, ricas, peruas e que tem dois namorados (Bob e Ken). Não que eu seja feminista, mas, sinceramente, alguém conhece alguma mulher que gostaria de ter sido a Barbie um dia? Acredito que hajam algumas por aí (por que não? Viva a democracia!) Mas não é o meu caso. Eu odeio a Barbie. Ponto final.
1 Comentários:
Sou professora e adorei seu texto. Imagina o quanto como somos manipulados... até mesmo nossos sonhos!
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